quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Chegou a hora de Diego retribuir. Trazer alma, vergonha na cara. Exigir respeito pelo São Paulo. Despertar, aos gritos, os acomodados companheiros de time. Este clube lhe deu fortuna, fama, Seleção Uruguaia, títulos. E o transformou em Lugano...

Chegou a hora de Diego retribuir. Trazer alma, vergonha na cara. Exigir respeito pelo São Paulo. Despertar, aos gritos, os acomodados companheiros de time. Este clube lhe deu fortuna, fama, Seleção Uruguaia, títulos. E o transformou em Lugano...




30 anos em qualquer carreira traz lembranças. Ao estilo "Confesso que Vivi", de Pablo Neruda, sem um pingo da genialidade do chileno, lembro de abril de 2003. Éramos no máximo seis jornalistas no CCT da Barra Funda. A Internet era uma desconhecida. O São Paulo estava mal nas mãos de Oswaldo de Oliveira. O então presidente Marcelo Portugal Gouvêa chega de surpresa. Trazendo um garoto tímido como nova contratação. Se chamava Diego, era uruguaio. Vinha do Nacional do Uruguai. Era a grande promessa do país vizinho. Perguntei a Marcelo quem o observou, quem recomendou. Tomei um susto com a resposta. "Eu tive boas indicações. A pessoa que me recomendou é da minha total confiança." Fui perguntar para Oswaldo se ele ao menos conhecia Diego. "Nunca ouvi falar", me disse, contrariado. Telefonei para um repórter uruguaio do El País. Ele me disse que o zagueiro era reserva no Nacional e tinha atuado emprestado no pequeno Plaza Colonial. Treinado pelo iniciante Diego Aguirre, o time havia conseguido uma vaga na Libertadores. O Nacional quis fazer dinheiro com o zagueiro raçudo. Na conversa descubro que a pessoa de "total confiança" e que indicou o atleta a Marcelo Portugal foi Juan Figer. Empresário do próprio zagueiro. Logo o uruguaio virou o "jogador do presidente". Enfrentou todo o questionamento dos jornalistas com muita firmeza. Inclusive o meu. Por coincidência, nos encontramos na praça de alimentação do shopping. Ele estava com a esposa e um filho pequeno. Sem ser reconhecido por ninguém. Conversamos, percebi o quanto estava difícil para um garoto de 22 anos, o início a vida em um país estrangeiro. Em um clube com tanta cobrança. Foi gentil, embora desconfiado.

Na hora da despedida, me apertou forte a mão e garantiu. "Vou provar que o presidente acertou me contratando", disse confiante. Ele se lembrava muito bem do meu questionamento a Marcelo Portugal, no dia de sua apresentação. No mês seguinte, o repórter que cobria o São Paulo retornou das férias. E voltei ao Corinthians, onde fiquei 17 anos. Do Parque São Jorge percebi que o "jogador do presidente" cumpriu sua palavra. Perdeu a timidez. Impôs seu garra, sua personalidade forte, que estava escondida. E mais do que isso. Se mostrou ótimo na antecipação, no cabeceio, na recuperação. Foi campeão da Libertadores. Do Mundo. Virou titular absoluto da Seleção Uruguaia. A última vez que encontrei Marcelo Portugal foi em um programa que participamos na Rede TV! O São Paulo já era campeão do Mundo em 2005. E Diego era Lugano. "Lembra do "jogador do presidente"? Provocou", rindo, satisfeito.

Sorri de volta, reconhecendo o acerto. Nos demos as mãos, não havia mágoa, raiva. Ele sabia que o repórter tinha de desconfiar de um atleta recomendado pelo próprio empresário e comprado pelo presidente, sem o treinador saber ao menos de quem se tratava. O dirigente era um homem diferenciado no futebol. Nunca mais falei com Marcelo, que faleceria em 2008. Estive com Lugano várias vezes depois. Copa América, Eliminatórias, Copa do Mundo. Como capitão da Seleção Uruguaia. Sua personalidade forte, a explosão muscular e o futebol viril se impuseram. Ele é amigo íntimo do médico Marco Aurélio Cunha. E de Rogério Ceni. Os três sempre mantiveram contato. Lugano garantiu que o clube onde se sentiu mais acolhido foi o São Paulo. E queria encerrar sua carreira como jogador com a camisa que mais teve prazer em vestir. Enriqueceu com suas passagens por Fenerbhace, Paris Saint Germain, Malaga e West Bromwich. Ao deixar o PSG, em 2012, queria voltar ao São Paulo, quatro anos atrás. Mas o então responsável pelo futebol, Adalberto Batista, decidiu apostar em Lúcio. Foi muito frustrante para o uruguaio. Diego estava pronto para retornar ao Morumbi outra vez em maio de 2014. Ele não conseguia render na Inglaterra. Tinha uma lesão na articulação do joelho esquerdo. Se curou no Reffis. Mas não houve tempo de recuperar a explosão muscular, a forma física. Por isso só conseguiu atuar em apenas um jogo na Copa do Mundo.

O uruguaio estava pronto e falou a Ceni sobre a vontade de atuar no São Paulo. Carlos Miguel Aidar não quis. Acreditou que traria um problema. O dirigente sabia o quanto o jogador era ídolo da torcida, admirado pela imprensa. E como tem personalidade forte. Se não conseguisse se recuperar, aceitaria a reserva? Falou a Figer, seu eterno empresário, que não o contrataria. Lugano ficou um ano sem clube, se recuperando fisicamente. Até que teve mais uma passagem pífia. Desta vez no Häcken da Suécia. Em 2015, tentou novo retorno ao São Paulo. Outra negativa. Desta vez, quem não quis de maneira alguma foi Juan Carlos Osório. Acertou então com o Cerro Porteño um contrato de dois anos. Recebendo 70 mil dólares mensais, R$ 284 mil, o maior salário do Paraguai. No contrato havia um cláusula que poderia ou não fazer com que jogasse no São Paulo. Se algum clube ofertasse mais do que recebesse no Cerro e ele quisesse ir, o clube teria de liberá-lo. Ideia genial de Figer. Foi o que aconteceu. Pressionado por conselheiros, Leco resolveu oferecer R$ 300 mil ao zagueiro. E situação resolvida. O atual presidente do São Paulo é uma pessoa muito indecisa. Sabe que, com a saída de Rogério Ceni, precisava de um escudo. Não só para ele, mas para o novo treinador Edegardo Bauza. Alguém capaz de desviar o foco. Assumir a capitania do time. Ser o símbolo do time lutador, com garra, disposto a sangrar por uma vitória. Bem diferente da equipe omissa de 2015. Essa foi o principal motivo que Milton Cruz deixou a Comissão Técnica. Leco acreditava que ele era "amigo demais" dos jogadores. E aceitava a falta de garra de Paulo Henrique Ganso, Michel Bastos, Wesley, entre outros. Milton virou "analista de desempenho". Ninguém melhor do que Lugano. Bauza não tem nada contra veteranos. Pelo contrário. Na disputa do Mundial de 2014, ele pediu a contratação do então capitão da Seleção Colombiana, Mario Yepes. Ele tinha 38 anos. Lugano tem 35. No Paraguai há rodada uma vez por semana. O zagueiro foi capitão do time, atuou 16 vezes. Marcou cinco gols. Sua melhor média em toda a carreira. Os exames médicos que chegaram até o São Paulo o mostra recuperado.

Bauza parece ser o treinador ideal para a volta de Lugano ao São Paulo. O treinador é adepto do futebol defensivo, de muita marcação. Ganhou duas Libertadores com seus times muito protegidos na defesa. A LDU utiliza um fixo 3-5-2. Três zagueiros fixos para a liberação dos alas. No San Lorenzo, revezava entre o 3-5-2 e o 4-1-4-1. Dificilmente o zagueiro uruguaio ficará no "mano a mano" com um atacante veloz adversário. Rogério Ceni após a sua despedida conversou muito com Lugano. Assim como Marco Aurélio Cunha. Os dois o convenceram que o momento é ideal para seu retorno. Não há um líder no elenco. O que começa a despertar, Rodrigo Caio, ainda é novo. E os gritos e cobranças não são levados ainda em consideração. O uruguaio tem a certeza que agora é o São Paulo quem precisa dele. "Não posso dar as costas à minha história e ao carinho que tenho pelo São Paulo e sua torcida. É o clube que me deu tudo, confiou em mim quando era garoto. Agora tenho 35 anos, não me resta mais muito tempo de futebol e, por isso, fiz a opção pela minha saída para voltar", disse ao se despedir do Cerro Porteño.
Bem-vindo, Diego. Você não é mais o "jogador do presidente". É esperança de milhões de são paulinos, cansados dos omissos. A volta de um time que não aceita a derrota. Que tem vergonha na cara. Não sai do gramado sorrindo, depois de perder por 6 a 1 para o Corinthians. Mostrar que talento sem ambição, sem vibração, sem garra, não é nada. Grite, cobre, acorde os enriquecidos mortos-vivos no time. Exija que o São Paulo Futebol Clube seja respeitado. Exija! Não só pelos adversários. Principalmente pelos acomodados companheiros. Chegou a hora de retribuir o que recebeu, Diego. Fazer história no clube que o enriqueceu.

O levou a capitão da Seleção Uruguaia.

E o transformou em Lugano...



Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 07 Jan 2016 12:07:15

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