sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Gilvan Tavares foi acometido de 'zezenite' crônica. E comanda, alegre, o desmanche do Cruzeiro. Dinheiro está valendo mais que Libertadores na Toca da Raposa...

Gilvan Tavares foi acometido de 'zezenite' crônica. E comanda, alegre, o desmanche do Cruzeiro. Dinheiro está valendo mais que Libertadores na Toca da Raposa...




Começa com um comichão. Depois chegam os suores noturnos. A vontade de não conversar com ninguém. Nem com os familiares mais próximos. A febre começa a dominar. A pergunta mais constante é: "e se eu vender?" A resposta vem imediata, silenciosa. "Quem manda sou eu." Essa compulsão dominou por anos e anos a mesma cadeira, na mesma sala. Era chamada de Zezenite. Uma vontade incontrolável de comprar e vender jogadores. O Cruzeiro formou e desmanchou times excelentes, médios e fracos com uma velocidade inacreditável. O torcedor não tinha nem tempo de decorar a escalação da equipe. O hoje senador Zezé Perrella confundia seu tino comercial que trouxe de seus frigoríficos. E os jogadores eram vistos apenas como mercadorias, carinhosamente chamados de "patrimônio do Cruzeiro". A insana troca de elencos atrapalhou demais. Como por exemplo o estupendo time de 2003, o único brasileiro em todos os tempos a ganhar o seu estadual, a Copa do Brasil e o Brasileiro. Gomes, Maicon (Maurinho), Cris (Luisão), Edu Dracena e Leandro; Maldonado, Augusto Recife (Felipe Melo), Wendell (Zinho / Martinez) e Alex; Aristizábal (Márcio Nobre) e Mota (Deivid). Esse era o time base. Vanderlei Luxemburgo fez seu último grande trabalho com essa equipe. Alex nunca mais jogaria tanto futebol na vida. Mas essa equipe seria desmanchada como tantas outras. Sua mentalidade pode ser resumida nestas frases. "Dinheiro em caixa nunca teve, na verdade, o Cruzeiro, nem clube nenhum. Porque o objetivo do clube não é lucro. Têm duas maneiras de você pagar as suas contas, ou você vai ao mercado financeiro e arranja recursos, ou você vende jogadores. Eu preferia vender do que ficar devendo nos bancos."

Foram 17 anos e 22 títulos da dinastia Perrella. Com centenas de entra e sai de jogadores. E a sensação de que o Cruzeiro poderia ter ido muito mais longe. Uma Libertadores, a Tríplice Coroa e o tricampeonato da Copa do Brasil acabou sendo pouco. Construiu a Toca da Raposa II, no bairro Enseada das Garças e a sede administrativa no bairro Barro Preto, no centro de Belo Horizonte. Mas o orgulho do senador foram as vendas milionárias que conseguiu fazer. Fábio Júnior, em 1999, por U$ 15 milhões, do meia Geovanni, em 2011, por U$ 18 milhões, além do atacante Fred, em 2005, por R$ 36 milhões. Gilvan Tavares o substituiu. Foi o braço direito do senador por anos e anos. As queixas que mais ouvia dos conselheiros e companheiros de diretoria eram em relação à venda desenfreada de jogadores. Prometeu que não seria assim. Sua filosofia seria montar equipes vencedoras e continuar com elas. Manter a base, resistir a propostas interessantes, foi o segredo do bicampeonato brasileiro seguido do Cruzeiro. Dominou o país com a equipe montada por Marcelo Oliveira em 2013. Juntou o dinheiro das vendas de Montillo e Diego Souza. Seu time venceu o Mineiro e o campeonato nacional do ano passado. Chegou à final da Copa do Brasil. E tropeçou na Libertadores. O balanço acabou sendo ótimo. Marcelo Oliveira deu várias entrevistas dizendo que o elenco havia ganho maturidade. E estava pronto para disputar a Libertadores, principal objetivo em 2015, para ganhar. Mal sabia ele que a "zezenite" começava a atacar Gilvan. O presidente cruzeirense tomou uma invertida inesperada no ano passado. Enquanto a equipe continuava a impressionar o Brasil, ele decidiu ser deputado estadual. Caiu no conto que sua eleição seria "uma barbada", já que presidia o Cruzeiro. Os eleitores agradeceriam tantas alegrias que tiveram com votos. Não foi assim.

Gilvan passou por um vexame. Teve apenas 38.400 votos pelo Partido Verde. Foi 0,37% dos 10.346.814 votos válidos em Minas Gerais. A decepção tomou conta de sua alma. Se calou. Mas ele percebeu que o elo com os torcedores cruzeirenses não era tão grande. Enquanto Zezé Perrella virou senador da República, nem deputado estadual ele conseguiu se eleger. A decepção trouxe um outro lado inesperado. Gilvan se sentiu mais livre para agir. Não havia mais aquele apelo emocional. Que já havia sofrido um rompimento por causa das organizadas, que estragaram a comemoração do primeiro brasileiro em 2013. Mesmos vândalos que o haviam ameaçado de morte quando contratou o "atleticano" Marcelo Oliveira. Foi por isso que não lhe doeu a consciência ao vender uma peça chave do time: Ricardo Goulart. Gilvan analisou a recessão que o país enfrentará em 2015. Repassou o meia atacante de 23 anos e muito futebol por R$ 48 milhões ao Guangzhou Evergrande. Despachou Egídio, lateral esquerdo titular, ao Dnipro da Ucrânia, por R$ 6,4 milhões. Nilton foi para o Internacional por R$ 4 milhões. Marlone foi liberado para atuar no Fluminense, Samudio no Libertad do Paraguai, Marcelo Moreno voltou para o Grêmio, Borges, dispensado. Dagoberto também será. A mínima dor na consciência que poderia dominar o dirigente foi embora. Bastou olhar para o lado e ver o Atlético vender sem piedade Diego Tardelli por apenas R$ 15,9 milhões. Uma péssima venda. O valor foi confirmado pelos chineses. Envergonhados, os dirigentes atleticanos tentam desmentir o pouco dinheiro recebido pelo atacante titular da Seleção Brasileira. A notícia de ontem na Toca da Raposa foi a confirmação da venda do excelente volante Lucas Silva para o Real Madrid. Foram cerca de R$ 45 milhões pelo jogador de grande futuro. E apenas 21 anos.

E hoje, os torcedores cruzeirenses estão apavorados. Há uma proposta do mundo árabe por Everton Ribeiro. Gilvan Tavares já mandou avisar que não há atleta inegociável. E que se o dinheiro oferecido o contentar, o meia da Seleção Brasileira será despachado, sem piedade. Do time principal que participou das campanhas nos Brasileiros de 2013 e 2014 só restam Fábio, Mayke, Léo, Henrique, Willian e Everton Ribeiro. O Cruzeiro já contratou meia dúzia de atletas para esta temporada. O lateral Fabiano, da Chapecoense , o volante chileno Seymour, do Genoa-ITA, o meia uruguaio De Arrascaeta do Defensor, e os atacantes Joel, camaronês do Coritiba, Leandro Damião do Santos e Riascos, colombiano, do Morelia do México. O ritmo frenético do entra e sai na Toca lembra a dinastia de Zezé Perrela. Marcelo Oliveira não tinha a menor ideia de que tudo isso iria acontecer. Sem Alexandre Mattos para lhe controlar, Gilvan assumiu o futebol, como o agora senador gostava de fazer. Fez o desmanche sem a menor dor na consciência. Teoricamente, a conquista da Libertadores e do terceiro Brasileiro seguido ficou muito difícil. Marcelo Oliveira não tinha a menor ideia de que a equipe que lhe dava tanto orgulho seria desfigurada. Agora será obrigado a montar, formar um novo time. E em tempo recorde. Com a pressão de disputar para ganhar a competição mais importante da América do Sul. Ainda mais com a concorrência fortíssima do eterno rival Atlético Mineiro. Tudo o que está acontecendo na Toca da Raposa é por ordem de Gilvan Tavares. Um dirigente dominado pela moléstia batizada de "zezenite". A filosofia mudou. Dinheiro vale mais do que a chance real de conquistar a Libertadores de 2015. Que tristeza...





Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 23 Jan 2015 12:23:41

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