segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

O púbis não permitiu que Kaká fosse importante dentro do campo. Mas fora dele, sua missão foi cumprida. Mostrou o quanto os nossos treinadores são ultrapassados. E que o Brasil hibernou em cima do título de pentacampeão do mundo...

O púbis não permitiu que Kaká fosse importante dentro do campo. Mas fora dele, sua missão foi cumprida. Mostrou o quanto os nossos treinadores são ultrapassados. E que o Brasil hibernou em cima do título de pentacampeão do mundo...




Kaká sabe que não estará na Copa do Mundo de 2018. Terá 36 anos. Nos seis meses que atuou no São Paulo, infelizmente ficou claro para seus companheiros, o quanto ele se sacrifica para jogar futebol. Suas dores no púbis o acompanham há anos. Ele precisa fazer exercícios específicos antes e depois das partidas. O exemplo de dedicação para enfrentar o sacrifício o tornou mais querido ainda no Morumbi. Foi um dos maiores motivadores do elenco. Mas dentro de campo desde 2010 não é o mesmo jogador. Se existe alguém que sabe bem disso é Dunga. Kaká estava com problema gravíssimo no joelho esquerdo, além do púbis. Religioso, enfrentava as dores lancinantes acreditando que teria ajuda divina para superá-las. A fé veio de um acidente quando era garoto e afetou a coluna. Médicos chegaram a dizer que mal poderia andar, quanto mais jogar futebol. Se apegou na religião, no tratamento e em 2007 foi eleito o melhor do mundo. Médicos nos Estados Unidos ficaram chocados com o estado do seu joelho. Disseram ter sido "um crime" o Brasil o ter colocado em campo na África do Sul. Mas quem insistiu foi ele. Só era traído em alguns testes por lágrimas furtivas que escorriam de seus olhos. Atuou no seu limite. Jogou mal. O Brasil perdeu. E ele nunca mais foi o mesmo jogador, de arrancadas fulminantes, dribles em velocidade desconcertantes. Faltava o arranque. Por isso a decepção no Real Madrid. E a apagada volta ao Milan. Ao sair do São Paulo em 2003, jurou que encerraria a carreira no Morumbi. Racional, percebeu que o contrato com o Orlando City impediria o desfecho emocionante. Tratou de encaixar seis meses para seu adeus. Conseguiu amarrar um acordo que obrigava o time norte-americano a pagar R$ 400 mil dos seus salários. Com alegria, a direção são paulina repassou os R$ 400 mil que pagava para o colombiano Pabon. E Kaká ganhava seus R$ 800 mil. Quem acredita que é muito não sabe que, no Orlando City, o meia receberá R$ 1,4 milhão a cada 30 dias. Seus seis meses no Brasil não deixarão saudades dentro do campo. Mesmo com o nível técnico baixo do nosso futebol, esteve longe de brilhar nas 24 partidas que disputou, marcando apenas três gols. Ficou o exemplo, a determinação, o carisma. Mesmo com a sua vida particular implodindo, com a separação no seu casamento. O púbis foi seu grande inimigo, que contribuiu para tão poucos arranques. Tanto que pretende levar um fisioterapeuta de São Paulo para Orlando só para ajudá-lo a suportar jogar futebol. Mas enquanto esteve por aqui, Kaká percebeu os motivos que fizeram o Brasil ser humilhado na Copa que promoveu. A acomodação com o pentacampeonato mundial. E o atraso dos treinadores nacionais. "Acredito que o futebol aqui está parado, está estagnado. Aquilo que o Brasil conquistou, como o pentacampeonato, fez com que nós brasileiros nos acomodássemos. Temos um dos campeonatos mais competitivos do mundo, se não for o mais, pelo número de grandes equipes. Mas em termos de crescimento, de organização e de planejamento, ainda está devendo."

"O futebol parou no tempo. E acho que muito em função do comodismo que foi campeão do mundo e achar que somos melhores. Os treinadores poderiam abrir a mentalidade para aprender outro futebol. Na Europa, você acaba jogando com time italiano, espanhol, inglês, alemão, e os treinadores conversam entre eles. Um olha o jogo do outro. O futebol brasileiro não olha o chileno, o argentino, o equatoriano. Não tem vontade de aprender", falou para a rádio Jovem Pan e para a TV Globo. Kaká sempre foi um gentleman. Sempre fugiu das polêmicas com elegância. Mas avisou o assessor de imprensa do São Paulo, Juca Pacheco, que estava disposto a dar algumas entrevistas antes de ir para os Estados Unidos. Quis falar para dar sua contribuição. Como um dos grandes ídolos do futebol contemporâneo do país, desejou colocar o dedo na ferida. Kaká se referia diretamente a Felipão e Parreira. Os dois comandantes da Seleção na Copa do Mundo de 2014 foram quem insistiram várias e várias vezes antes do Mundial. O Brasil não precisaria se preocupar com os outros selecionados. Afinal era o único pentacampeão. Ninguém havia conquistado cinco vezes uma Copa. Pouco importava que havia sido há 12 anos. A Alemanha não foi observada, assim como a Holanda, a Argentina. Nem mesmo a Colômbia ou o Chile. A concentração na Granja Comari acabou escancarada para a Globo e a imprensa de todo o planeta. O Brasil foi a única dos 32 selecionados que não fez um treino fechado. Suas vísceras foram escancaradas. Por pura prepotência, arrogância. E medo de contrariar a emissora carioca. O resultado foi desastroso. Esquema tático ultrapassado, dependência estúpida de Neymar, descontrole emocional. Fracasso inesquecível. E nem esse fracasso serviu para que algo concreto fosse feito por quem comanda o futebol brasileiro. Os torneios continuam se encavalando para encaixar na grade de programação da Globo. No campeonato nacional que disputou acompanhou as 23 trocas de treinadores. Os clubes rasgando qualquer planejamento. Percebeu o nível baixo do futebol no país. Viu as categorias de base dominadas por empresários. A exportação de jogadores cada vez mais jovens. Casos como o de David Luiz, que nunca atuou por um clube brasileiro, se repetirão com certeza. Kaká percebe que a tendência é a Seleção ter cada vez menos identificação com os torcedores no País. Algo mais do que preocupante. Pesquisas em 2013 já apontavam que 53,1% dos brasileiros que gostam de futebol já acompanhavam e torciam por clubes europeus.

A média dos últimos campeonatos por aqui dão toda a razão para Kaká. O Brasileiro de 2014 teve média de 16.555 pessoas. O Paulista chegou a 5.675 torcedores. O Mineiro, 4.257 pagantes. O Carioca ficou em 2.828 pessoas. O Gaúcho, 2.379 testemunha. Algo mais do que alarmante, já que muitos desses números eram pré-Copa, quando havia a esperança de conquista do hexacampeonato. Se dentro de campo Kaká fez o que pôde, e foi muito pouco pela expectativa, fora dele sua contribuição acabou sendo muito maior. No São Paulo mostrou o que significa sacrifício, vontade de jogar. E nos dirigentes da CBF, escancarou o motivo do nosso fracasso, do nosso atraso. José Maria Marin e Marco Polo del Nero não tomam atitudes porque não querem. Como mudar o calendário, adequá-lo ao europeu, permitindo intercâmbio. Extinguir, ou minimizar mais ainda, os inúteis e desgastantes estaduais. Incentivar estágios de novos treinadores nos principais centros europeus. Diminuir o poder dos empresários nas categorias de base. Punir clubes que servem de barriga de aluguel de agentes. Exigir a quarentena nos campeonatos. Ou seja, treinador demitido fica impedido de trabalhar em outra equipe no mesmo torneio. É preciso agir. Sair da estagnação. Caso contrário este mesmo discurso feito por Kaká será ouvido daqui a três Copas do Mundo, em 2026. Quando Neymar voltar a jogar no Brasil. Aos 34 anos, insistirá no abismo do futebol europeu, na falta de intercâmbio, no atraso tático dos nossos clubes, nos vexames nos Mundiais. E outra vez José Maria Marin, com 94 anos, e Marco Polo del Nero, com 85, ainda comandando a CBF vão prometer mudanças profundas no nosso futebol. Só não vão colocá-las em prática. Continuam com outras prioridades...





Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 22 Dec 2014 13:11:06

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