quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Morre Juvenal Juvêncio, o 'coronel do Morumbi'. É o fim de uma era. A do presidente ditador, centralizador. Ninguém vai negar seu amor ao poder. Mas também ao São Paulo Futebol Clube...

Morre Juvenal Juvêncio, o 'coronel do Morumbi'. É o fim de uma era. A do presidente ditador, centralizador. Ninguém vai negar seu amor ao poder. Mas também ao São Paulo Futebol Clube...




Ninguém ganhou mais títulos na história do São Paulo. Mais do que Cícero Pompeu de Toledo. E ninguém teve tanto poder no Morumbi. Fazia torcedores organizados, jornalistas, conselheiros, jogadores e treinadores se calarem. Adorava o poder. E o apelido de coronel. Foi dez anos presidente. Se não fosse o câncer na próstata, que o levaria à morte hoje, aos 83 anos, seguiria o quanto pudesse e quisesse no cargo. Articulador e de grande personalidade, Juvenal representava o autoritarismo levado às últimas consequências. Ele era meticuloso, centralizador e fazia questão de tomar todas as decisões mais importantes no futebol do São Paulo. Desde as contratações do elenco, escolha de treinador, dirigentes. "Não delego. O regime é presidencialista. Quem me escolheu sabia o que queria. Alguém com capacidade para comandar este gigante que é o São Paulo Futebol Clube. A última palavra é minha e não abro mão. Autorizo ou veto de acordo com o bem do meu clube. Ponto final." Essa declaração de Juvenal resume o quanto era intenso, firme, poderoso. Para o bem e para o mal. Adorava os vestiários e era aceito com entusiasmo pelos jogadores. Não só porque era engraçado, provocador, impaciente com as derrotas. Mas sim porque aprendeu um truque quando era diretor de futebol em 1984 até 1988. Se acostumou a ganhar a dedicação, o carinho dos jogadores. A cada vitória, fazia questão de levar a premiação ele mesmo. Nos vestiários distribuía os pacotes de dinheiro. "Em espécie. Jogador de futebol gosta de passar a mão, de cheirar o dinheiro. Fica mais entusiasmado do que saber que está depositado na sua conta. Sempre tive prazer em pagar dessa maneira." Juvenal era especialista em formar alianças. Principalmente com as estrelas do time. Via em Rogério Ceni a sua definição se fosse jogador. A afinidade entre os dois sempre foi imensa. Competitivos, autoritários, firmes e sem aceitar contestação. O goleiro domina os vestiários do São Paulo como Juvenal controlava o clube quando era presidente. A admiração mútua sempre garantiu em períodos eleitorais o apoio de Rogério ao velho caudilho. Fazia questão de atuar com uma espalhafatosa camisa amarela, cor que marcava o grupo eleitoral do presidente. Foi a Juvenal que Rogério confessou que depois da carreira pretende ser treinador. Quer passar provavelmente um ano na Europa e depois assumir o desafio, em 2017. Assim como Zico faz com o Flamengo, Ceni teme perder a idolatria caso aceite ser técnico do São Paulo. Isso foi alvo de longas conversas entre eles. Os dois se adoravam.

Foi Juvenal quem convenceu Luís Fabiano a não ir para o Corinthians e voltar ao São Paulo. Fazia questão de falar pessoalmente com jogadores importantes que viriam ao clube. Sua relação também era intensa com Muricy Ramalho. Dizia a todos que ele nasceu para comandar o clube. E que poderia dar "umas voltinhas por aí", mas sabia que seu lugar era o Morumbi. Nunca perdoou Carlos Augusto Barros e Silva pela demissão humilhante de Muricy em 2009. Leco queria que o treinador que era mandado embora se despedisse ao lado do contratado Ricardo Gomes. Juvenal na última hora evitou o constrangimento. Mas não a tristeza, o rancor de seu técnico predileto. Tanto que o chamou quando o São Paulo caminhava perigosamente para o rebaixamento em 2013. "Eu fiquei muito feliz por trazê-lo de volta para o lugar de onde nunca deveria ter saído", comemorou, na época, Juvenal. Poucos sabiam que a contratação era um pedido de desculpas. A grande derrota na trajetória de dez anos como presidente do São Paulo foi a Copa de 2014. Ele tinha certeza que o Mundial seria a maneira de modernizar o Morumbi. Economizar pelo menos R$ 500 milhões. Seu desejo era transformar o estádio em arena coberta. Com direito a estacionamento gigante e metrô na porta. Embora tivesse sido avisado, não acreditou que fosse verdade. Só no último momento, quando tudo estava perdido. O então presidente da CBF, Ricardo Teixeira, articulou com o agora deputado federal pelo PT, Andrés Sanchez. Teixeira sabia que precisava da aprovação do Palácio do Planalto para agir como quisesse como presidente do Comitê Organizador Local da Copa. Várias questões delicadas passaram por Lula e sua sucessora, Dilma.

Então Teixeira procurou Andrés e os dois articularam a construção do Itaquerão. Projeto que custaria R$ 1,2 bilhão. Juvenal não acreditou que o governador José Serra fosse permitir essa obra. Afinal, reformar o Morumbi deveria sair por R$ 500 milhões, no máximo R$ 600 milhões. A metade. São Paulo já tinha o Pacaembu, a nova arena do Palmeiras que estava sendo articulada, o Canindé. Juvenal só se conscientizou, quando era tarde. Sua briga política com Ricardo Teixeira e a rivalidade com Andrés Sanchez, que chegou ao limite quando decidiu dar apenas 10% dos ingressos aos corintianos em um clássico, em fevereiro de 2009, custariam caro demais. É uma derrota que o São Paulo ainda não conseguiu se recuperar. Não consegue até hoje levantar dinheiro para reformar o Morumbi. "Trocaram o Morumbi por um terreno em Itaquera", desabafava, amargurado. "A culpa é do Serra e do Kassab", tentava justificar. Juvenal não trabalhou bem as finanças do clube. De 2005 até sair, no passado, a dívida saltou de R$ 27 milhões para R$ 251 milhões. Resultado da sua maneira centralizadora de administrar o clube. Sua grande satisfação é o CT de Cotia. Lá o São Paulo mantém sua categoria de base. É o melhor do Brasil. Em um terreno de 220 mil metros quadrados, tem 11 campos de futebol, um pequeno estádio, hotel com capacidade para 138 jogadores. Foi usado pela Colômbia na Copa de 2014. Há um centro de Fisioterapia e Fisiologia. A obra sempre foi o orgulho de Juvenal. Ele tem todo o mérito por moderniza o CT. Além disso, criou o Reffis, no CCT da Barra Funda.

Como diretor de futebol, vice e presidene, Juvenal comemorou quatro Campeonatos Brasileiros, um Mundial, uma Taça Libertadores, três Paulistas e uma Copa Sul-Americana. Queria fazer Adalberto Baptista seu sucessor. Mas o empresário milionário se mostrou truculento com os jogadores e imprensa. Não deu certo. Juvenal resolveu apostar em Carlos Miguel Aidar. Ele havia sido o homem que deu seu primeiro cargo, como diretor de futebol em 1984. E também, com a autoridade de ex-presidente da OAB, articulou legalmente o seu terceiro mandato seguido. O que na prática foi um golpe para seguir no poder. Já com câncer na próstata, abandonou o tratamento para ajudar na eleição de Aidar. Não defendeu os ataques da oposição à filha do novo presidente, agente Fifa. Houve uma briga lastimável pela imprensa. Aidar não só o demitiu do CT de Cotia, como tentou desmoralizá-lo. Mostrou como a administração do São Paulo era ultrapassada. Juvenal estava muito doente nos últimos tempos. Mas, acompanhou com lucidez, a humilhante renúncia de Aidar, envolvido em várias denúncias. A morte de Juvenal Juvêncio coloca fim à era ditatorial do São Paulo. Nenhum presidente terá tanta autonomia. Nem será tão centralizador. É impossível comandar um clube da elite do futebol mundial desta maneira. Por trás de todo folclore, Juvenal foi importantíssimo. Modernizou o CT de Cotia, criou o Reffis, montou grandes times. Errou também por não se modernizar. Na avaliação da concorrência com Andrés pela Copa. No aumento das dívidas. Sua última passagem mostrou o fim de uma era. A do "coronel" do Morumbi. Mas ninguém vai negar seu amor ao poder. E, principalmente, ao São Paulo Futebol Clube. Descanse em paz, Juvenal Juvêncio...





Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 09 Dec 2015 12:14:52

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