sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

O adeus do maior ídolo da história do São Paulo. Arrogante, prepotente, transgressor, obcecado, líder. Amado. Odiado. Nunca haverá um jogador como Rogério Ceni...

O adeus do maior ídolo da história do São Paulo. Arrogante, prepotente, transgressor, obcecado, líder. Amado. Odiado. Nunca haverá um jogador como Rogério Ceni...




"Não sou muito ligado em Seleção. Meu ganha-pão se chama São Paulo, minha Copa do Mundo é a Libertadores e meu coração tem três cores: vermelho, preto e branco." Demorou, foi adiado inúmeras vezes. Parecia que não existiria. Mas chegou o dia da despedida de Rogério Mücke Ceni. O maior ídolo da história do São Paulo Futebol Clube. Nunca houve tamanha simbiose no futebol brasileiro. Os dirigentes disfarçam quando estão em público. Mas quando se reúnem entre si assumem que se sentem administrando o clube mais elitizado deste país perdido na América do Sul. Por muito tempo assumiam ser um pedaço da Europa desenvolvida e que servia de referência aos atrasados rivais. Havia razão de ser. Donos do maior estádio particular do mundo. Primeiro a investir na construção de um Centro de Treinamento moderno. Pioneiro ao desvendar os segredos da fisioterapia, fisiologia, biomecânica. A ousadia chegava aos garotos com CT em Cotia com 11 campos, escola, hotel. O apogeu do clube coincidiu com a carreira, com os 25 anos de futebol de Rogério Ceni. Era o ídolo enviado pelos deuses do futebol. A encarnação desse sentimento de superioridade. Um ótimo goleiro que não se sujeitou apenas à defender, como todos. Transcendeu. Percebeu seu talento para repor a bola onde queria no campo. Incentivado pelo histórico preparador de goleiros, Valdir de Moraes, percebeu que a brincadeira de acertar camisas colocadas nos ângulos das traves era algo mais sério. E decidiu se candidatar a cobrar faltas para espanto dos técnicos e jornalistas. E orgulho de dirigentes e torcedores.

Percebendo a carência extrema de jogadores com personalidade forte, Rogério Ceni tratou de se impor. Não queria apenas mais as faltas. Também os pênaltis. Se Chilavert no Paraguai tinha essa licença, faria o mesmo no Brasil. Se tornou o goleiro que mais fez gols na história do futebol, 131 vezes. Mais do que o dobro do percursor. O paraguaio ficou apenas nos 62. Cobri o São Paulo por anos. E percebia o quanto Rogério Ceni era diferenciado. Arrogante, prepotente, mas preparado para os embates com jornalistas. Ele aproveitava as entrevistas para impor seu ponto de vista, não aceitava críticas de jeito algum, sabia o poder das palavras de um ídolo. Sua firmeza diante dos temidos repórteres repercutia na diretoria. Nos vestiários. Foi ganhando cada vez mais espaço. Logo virou capitão e elo entre o time e os presidentes. Paulo Amaral foi o único a enfrentá-lo, por duvidar de uma proposta do Arsenal. Acreditou que fosse uma manobra para conseguir aumento. O clube inglês não veio buscar o goleiro. E Amaral mandou que fosse afastado por 29 dias. Mas pressionado por um motim de conselheiros e membros de sua própria diretoria, o presidente recuou. E descobriu todo o poder de Rogério Ceni. O dirigente acabou queimado, sem apoio para sequer sonhar em reeleição. Perdeu apoio político. E quando ousou tentar voltar a concorrer à presidência no ano passado, percebeu que sua quarentena não havia acabado. Ninguém quis apoiar o homem que humilhou Ceni.

Como repórter do Jornal da Tarde, aprendi a usar todo o tempo extra que tinha em relação aos concorrentes. Procurava chegar mais cedo e invariavelmente saía mais tarde. Porque era possível o contato com os jogadores, além das entrevistas coletivas. E com 29 anos de carreira com jornalista posso testemunhar. Nunca vi ninguém treinar tanto quanto Rogério Ceni. Era obcecado em tentar corrigir suas falhas. Duas, inconfessáveis para ele. Mas não para preparadores de goleiros. A explosão muscular para bolas rasteiras. E as saídas. Nunca foi de se arriscar, preferia ficar embaixo das traves. O primeiro a chegar e último a ir embora. Sabia que seu talento natural tinha de ser aprimorado. Acabava treinando até em dias de folga. Jogou machucado, com dores inúmeras vezes. Não dava chance aos seus reservas. O espaço era dele e ponto final. Os jogadores o respeitavam, o chamavam de "presidente". Não é para menos. Ele se sentia no direito de indicar taticamente o que pensava para os técnicos. Os chamava para conversas particulares. Assim como fazia com os dirigentes. Sua voz muitas vezes era a mais alta. No manual de sobrevivência no Morumbi, o primeiro mandamento era não se indispor com Rogério Ceni.

Além de Paulo Amaral, Ney Franco e Adalberto Baptista compraram briga com o jogador. E se arrependeram. Saiu humilhado do São Paulo. Mário Sérgio que o impediu de bater faltas e Leão, que defendia a sua aposentadoria, também foram vítimas de sua ira. Não os defendeu para a diretoria. Ao contrário do que tanto fez com Paulo Autuori. O recorde de derrotas da história do clube, em 2013, talvez tenha acontecido pela insistência do goleiro. Ele convenceu Juvenal Juvêncio ao segurá-lo além do limite. Quanto a Baptista pagou caro que revelou que o goleiro estava atuando contundido e que pensava na aposentadoria em 2013. Ceni se vingou. Fez questão de lembrar enquanto o time sofria atuando em La Paz pela Libertadores, Adalberto participava de corridas na Europa. Mesmo sendo diretor de futebol. E trabalhou contra o homem que Juvenal via como seu sucessor. O goleiro venceu novamente. Em clube algum Rogério Ceni teria tanta autonomia. Essa foi uma das razões pelas quais não se impôs na Seleção Brasileira. Fora ter a concorrência de atletas melhores do que ele, como Marcos e Dida, sua prepotência o sabotou diante de técnicos e jogadores. Era notório como se isolava, não se entrosava. Foi campeão mundial em 2002, como terceiro reserva.

Mas para entrar na história, não precisou da Seleção. O que fez em 25 anos de carreira pelo São Paulo foi fabuloso. Derrubou recordes, foi capitão, presidente e ídolo. Suas preleções sempre foram arrepiantes. Era o escudo time nas várias desilusões dos últimos anos. Mas o protagonista inesquecível na última grande alegria. A conquista do Mundial de 2005. Sua atuação contra o Liverpool foi uma das melhores de um goleiro em todos os tempos. Garantiu o título diante de um massacre dos ingleses. Os rivais, principalmente os corintianos, os odiavam. Sonhavam em dar o troco. Doeu demais para eles sofrer o centésimo gol da carreira de Ceni. Mas não conseguiram. Ficaram em 95, em jogos profissionais. Adiou o quanto pôde sua aposentadoria. Mas confessou não ter força para bater tiros de meta. Dores nos tornozelos, joelhos e ombros eram companheiras diárias. Controlador, Rogério Ceni teve tempo para pensar o que queria e o que não desejava na sua despedida. Como foi revelado pelo blog, ele não quis uma revanche com o Liverpool de dez anos atrás. Não queria correr o risco de perder. Optou por uma festivo confronto entre os campeões mundiais pelo São Paulo. Sem compromisso com o resultado, deve até participar jogando na linha durante parte do jogo.
Ele nunca deixou de saber o que representa para o São Paulo. O Morumbi deverá ter perto de 60 mil pessoas hoje. Com preços majorados. Entre R$ 90,00 a R$ 320,00. A Fox Sports comprou o direito de transmitir o jogo com exclusividade. Além disso haverá várias recordações do goleiro sendo vendidas no estádio. O blog apurou que metade do lucro será dividido entre o clube e o goleiro. Será o reconhecimento do São Paulo ao seu maior ídolo. Nada mais justo. Sobre o futuro, ele diz que não sabe. Está entre ser treinador e dirigente. O falecido presidente Juvenal Juvêncio revelou que Ceni pretenderia passar um tempo na Europa fazendo cursos e deveria mesmo optar por ser treinador. A princípio dirigindo outros clubes e não o São Paulo. Repetiria o que fez Zico, não aceitando trabalhar no Flamengo. Não suportaria ser vaiado e xingado de burro pelos são paulinos. Mas tudo isso valerá depois de amanhã. Hoje, 11 de dezembro de 2015, o dia é seu. Chegou a tão adiada despedida. O futebol mundial ficará mais sem graça quando o sábado amanhecer. Nunca mais haverá alguém como Rogério Ceni...




Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 11 Dec 2015 12:00:09

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