sábado, 2 de maio de 2015

Robinho foi muito além de desafiar o Palmeiras com seu funk. O jogador de 31 anos tenta resgatar a alegria do "Neguinho do Cemi". E, com o título paulista, talvez dar sua última alegria ao Santos. O clube que ama não consegue pagar seus salários...

Robinho foi muito além de desafiar o Palmeiras com seu funk. O jogador de 31 anos tenta resgatar a alegria do "Neguinho do Cemi". E, com o título paulista, talvez dar sua última alegria ao Santos. O clube que ama não consegue pagar seus salários...




Robinho teve o mundo a seus pés. Sua vida parecia um conto de fadas. Quando garoto carregava o preconceituoso apelido de "Neguinho do Cemi". Aos cinco anos, para ajudar a família ficava cuidando dos carros, em troca de alguns trocados, na frente do Cemitério do Bitaru, em São Vicente. Enquanto os enterros aconteciam, aproveitava para jogar futebol na rua esburacada. Franzino, mal nutrido, chamava a atenção por sua habilidade e velocidade. A ginga, os dribles eram fundamentais para escapar dos pontapés dos irritados colegas mais velhos. Quando o funeral acabava, corria ainda mais para cobrar por ter "cuidado" dos carros. Sem dinheiro para comprar bolas de futebol, seus pais o mandava brincar com bolinhas de tênis usadas. A família aproveitava as que vinham parar no seu quintal, que ficava perto de uma quadra. O jogador garante que sua habilidade nasceu com as bolinhas amarelas. Foi levado para o futebol de salão, nos fraldinhas do Beira Mar de São Vicente. De lá, mais "experiente", aos nove anos foi para os Portuários. Seus dribles e 73 gols em uma temporada despertaram atenção do Santos. Ou melhor, de Roberto Antonio. Betinho era olheiro. E sempre foi fiel à sua filosofia. "A mina de ouro da Baixada está em São Vicente e nas cidades perto de Santos. Porque os pobres não têm dinheiro para morar lá, que é mais desenvolvida. E cara." Foi assim se apresentou à família de "Neguinho do Cemi". E o levou para o Santos. Um dia, levaria Neymar. Ao desembarcar na Vila Belmiro, Robson virou Robinho. Era melhor exorcizar qualquer ligação com cemitérios. Muito competitivo, individualista, o garoto misturava talento com total falta de preparo psicológico. Quando perdia o Santos perdia, ele voltava chorando, desesperado. Betinho o tentava acalmar. Mas o ego de Robinho não tinha limites. Se considerava único responsável pela vitória ou derrota do time. Betinho o convenceu que seu caminho era outro. Seu foco deveria ser em se tornar o melhor jogador do mundo. Potencial para isso isso tinha. Destro, jogaria na esquerda. Confundiria os marcadores, já que tanto poderia buscar a linha de fundo ou cortar pelo meio, escapando do lateral e do zagueiro central.

Quando tinha pela frente truculentos marcadores, se lembrava da esburacada rua em frente ao cemitério e os garotos mais velhos, loucos, tentando acertar pontapés em suas finas canelas. Suas arrancadas eram impressionantes. Os dribles desconcertantes. Logo estava nas mãos do mais ambicioso empresário do futebol brasileiro, Wagner Ribeiro. Ao mesmo tempo, caiu no canto da Sereia. Ouvia todos os dias do então presidente santista, Marcelo Teixeira: seria o sucessor de Pelé. Havia nascido para ser o "melhor do mundo". A imprensa também seguiu neste caminho. Até o também egocêntrico Leão se rendeu depois do que ele fez na final do Brasileiro em 2002. Pelé também se encantou com o jogador. E chegou a declarar. "O raio caiu duas vezes nesta Vila abençoada", disse às rádios. Ou seja, de novo o Santos tinha o melhor do mundo. Mesmo sem a autorização de Marcelo Teixeira, Wagner Ribeiro negociava o jogador. Benfica, Bayern, Chelsea, Milan estiveram bem perto. As ofertas se sucediam, quando a mãe de Robinho foi sequestrada em 2004. Ele decidiu ir embora de qualquer maneira para a Europa. Precisaria de muito dinheiro. Até para proteger sua família. Virou as costas a Marcelo Teixeira, saiu brigado com o Santos. Optou pelo Real Madrid. Foi quando deu a declaração que iria travar sua carreira. "Estou indo para o Real Madrid para ser o melhor do mundo."

A frase virou manchetes de jornais, repercutiu na televisão, nos rádios. E na concentração do Real. Repórteres espanhóis me confirmaram que o brasileiro foi boicotado. O "dono do vestiário" era o atacante Raúl. E invejoso com o assédio ao novo contratado, tratou de envenená-lo. Deixou claro que ele se colocava como mais importante que o clube, que seus companheiros. E que usaria a camisa merengue apenas para se promover, tentar ser o melhor do planeta. Raúl sempre foi muito amigo da direção do Real Madrid. Seus companheiros se fecharam com ele. Robinho não esperava essa resistência. Mas comprou a briga. Acabou engolido. Sabotado. Para piorar, também caiu na tentação de ganhar músculos para enfrentar os pesados gramados com a chuva e neve no auge do inverno europeu. Além dos seus eternos marcadores truculentos. O resultado não foi bom. Muito bem nutrido, perdeu velocidade. Seus arranques já não eram tão ágeis, imprevisíveis. Dono de uma técnica apurada, ele sobreviveu no futebol europeu. Mas não como protagonista. Sua personalidade difícil criou vários problemas. Como quando foi seduzido por Luiz Felipe Scolari. Já em segundo plano no Real Madrid, quis forçar sua ida para o Chelsea, do treinador brasileiro. A cúpula do Real soube que Wagner Ribeiro já havia acertada a transação. E deu o troco. Ou ele iria para o Manchester City ou não sairia do clube. Sem opção, Robinho foi para o time que não desejava. Dispensou Wagner Ribeiro pela precipitação. E tratou de mostrar seu descontentamento em não ir para o Chelsea. Sua passagem pelo City foi um inferno. Acabou várias vezes nem ficando na reserva. Teve brigas homéricas com treinadores, dirigentes. Voltou para o Santos para recuperar a autoestima. E se valorizar disputando a Copa da África. Foi o que aconteceu. O clube inglês o despachou com prazer ao Milan. Lá encontrou o clube decadente, sem o dinheiro e os craques que o consagraram no passado. As alegrias com o Campeonato Italiano no primeiro ano foram sumindo, assim como o potencial do time nos quatro anos seguidos. Sem mercado na Europa, mais reserva do que titular, acabou voltando ao Santos. Estava deprimido, esquecido na Itália. Precisava da idolatria que só encontra na Vila Belmiro. Emprestado. Com o clube do Litoral pagando os salários que somam os dois milhões de euros por temporada, cerca de R$ 6,7 milhões. O que faz com que receba cerca de R$ 558 mil. Ou melhor, não receba. O Santos lhe deve cerca de R$ 6 milhões em direito de imagem. Vanderlei Luxemburgo já lhe ofereceu o tapete vermelho, e salários em dia, para jogar no Flamengo depois da decisão do Paulista.

O presidente do Santos, Modesto Roma Júnior, está desesperado. Procura viabilizar alguma empresa ou um milionário que esteja disposto a pagar o salário do atacante. Mas com o país mergulhado na recessão está muito difícil. Não será surpresa se tiver de abrir mão do jogador. Modesto só repete que não agirá como o ex-presidente Luís Álvaro, mantendo atletas que o clube não pode pagar. Aos 31 anos, Robinho desfruta ainda da confiança de Dunga. Há chances reais de disputar a Copa América. Ser um reserva de luxo. Até como retribuição por ter enfrentado a direção do Manchester City várias vezes para aceitar convites da Seleção que disputaria a Copa de 2010. Os dois choraram muito na eliminação para a Holanda, nas quartas-de-final na África.

O Milan tem mais um ano de contrato com o atacante. Ele sabe que se for para a China, Japão ou Estados Unidos, poderá ganhar um bom dinheiro. Mas enterraria as chances de atuar pela Seleção. E hoje é um dos seus maiores orgulhos. Sabe que sua técnica ainda o garante como um dos melhores no país. Ele gosta disso. Viu o empenho com que o Santos o preservou para a final de amanhã contra o Palmeiras. Quando cantou o funk provocando o adversário, na verdade, impôs talvez sua última missão com a camisa santista. Dar o título paulista e ir embora do clube que está mergulhado em dívidas. Sem condições de pagá-lo. Ele já está milionário. Aproveitou bem sua transferência do Real para o Manchester, do City para o Milan. E os salários de oito anos de Europa. O garoto que ganhava a vida em frente ao cemitério foi muito além do que poderia imaginar. Mas ficou aquém do que desejava. Mal orientado, egocêntrico, não passou nem perto de ser melhor do mundo. Na Vila Belmiro, amanhã, tem a chance de mais uma vez retribuir ao clube que mudou sua vida. E que nunca lhe virou as costas. Pelo contrário. O acolheu com o carinho de quem o viu nascer. Cantando, o homem de 31 anos deixou vir à tona o jovem irreverente, egocêntrico, confiante. A resposta do que ainda pode fazer com a bola nos pés será dada amanhã. Os palmeirenses prometem que se arrependerá da ousadia, da arrogância de seu funk. Mal sabem eles que Robson de Souza não os estavam desafiando. E sim provocando o "rei das pedaladas". O "sucessor de Pelé". O "Neguinho do Cemi"...




Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 02 May 2015 11:58:36

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