terça-feira, 25 de novembro de 2014

Patricia e mais três gremistas foram premiados pela Justiça gaúcha. Não irão a julgamento, apesar de terem chamado Aranha de 'macaco'. Um erro que só estimulará vândalos e racistas nos estádios...

Patricia e mais três gremistas foram premiados pela Justiça gaúcha. Não irão a julgamento, apesar de terem chamado Aranha de 'macaco'. Um erro que só estimulará vândalos e racistas nos estádios...




Um tapa na cara na luta contra o racismo no Brasil. Patrícia Moreira, Fernando Ascal, Éder Braga e Rodrigo Rychter foram identificados. As câmeras da ESPN-Brasil identificaram os gritos de "macaco", vindo com ódio de Patricia para o goleiro Aranha. O trabalho competente da polícia gaúcha identificou Fernando, Éder e Rodrigo. Todos torcedores gremistas. Os entregou para a Justiça. E a Justiça fez um acordo vergonhoso para que o quarteto escapasse do julgamento popular. A legislação brasileira é hipócrita. Alguém chamar um negro de macaco é uma definitiva demonstração de racismo. Em todos os países civilizados. Mas aqui é "injúria racial". A melhor e mais didática explicação para essa farsa encontrei no blog Cena Jurídica de Paulo Renato Bezerra, nas palavras do professor de Direito Penal, Sandresson Menezes. Vale a pena ler para entender o que se passou com Aranha. E compreender porque esses quatro não foram presos assim que identificados, como deveriam. "A questão mais debatida no meio jurídico é a distinção entre injúria racial e racismo, onde uma começa e a outra termina. A questão é mais simples do que se pensa. Há a injúria racial quando as ofensas de conteúdo discriminatório são empregadas a pessoa ou pessoas determinadas. . Ex.: negro fedorento, judeu safado, baiano vagabundo, alemão azedo, etc. Tal crime está disposto no artigo 140, § 3º do CP. O crime de Racismo constante do artigo 20 da Lei nº 7.716/89 somente será aplicado quando as ofensas não tenham uma pessoa ou pessoas determinadas, e sim venham a menosprezar determinada raça, cor, etnia, religião ou origem, agredindo um número indeterminado de pessoas. Ex.: negar emprego a judeus numa determinada empresa, impedir acesso de índios a determinado estabelecimento, impedir entrada de negros em um shopping, etc. Entre as peculiaridades de cada crime encontram-se as seguintes diferenças: O crime de racismo é imprescritível e inafiançável, enquanto que o de injúria racial o réu pode responder em liberdade, desde que pague a fiança, e tem sua prescrição determinada pelo art. 109, IV do CP em oito anos. O crime de racismo, em geral, sempre impede o exercício de determinado direito, sendo que na injúria racial há uma ofensa a pessoa determinada. O crime de racismo é de ação pública incondicionada, sendo que a injúria racial é de ação penal privada (há quem defenda ser condicionada à representação);e nquanto que no crime de racismo há a lesão do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, no crime de injúria há a lesão da honra subjetiva da vítima." Pois bem, o quarteto que humilhou Aranha já tinha esse grande escudo da legislação. Poderiam no máximo, se julgados, pegar uma pena entre um e três anos. Além de multa. Mas como são primários deveriam pegar apenas a prestação de serviços comunitários. Mas haveria o julgamento. A sentença seria um marco. Abriria um precedente. Ficaria claro que estádio de futebol não é lugar para demonstrações de racismo, ou de injúria racial como está na nossa frouxa e hipócrita legislação.

Só que o juiz Marco Aurélio Xavier resolveu propor um acordo sem nexo. Ele suspendeu o processo contra o quarteto. Ofereceu algo muito mais palatável do que o julgamento. Ficariam muito expostos, coitados. Em vez disso, o juiz deu a chance que todos se apresentassem em uma delegacia antes dos jogos oficiais do Grêmio, dentro ou fora de Porto Alegre. Até agosto de 2015. Muito unidos, os quatro aceitaram imediatamente a proposta. Marco Aurélio Xavier estava muito bonzinho. E sugeriu que em vez de ir até a delegacia, usassem tornozeleiras eletrônicas. Os gremistas não quiseram ser monitorados na polícia. Recusaram. O juiz aceitou a negativa. Mas deixou avisado que, se eles cometerem outro crime até agosto de 2015, o processo de "injúria racial" será reaberto. E aí sim poderão ir a júri popular. E mais para os quatro não serem novamente lembrados, os próximos passos envolvendo o processo correrão em segredo de justiça. Ou seja, a imprensa e a população não ficarão sabendo. O "próximo passo", se os quatro cumprirem o que foi proposto, será a suspensão permanente, a extinção do processo. A decisão do juiz é lamentável. Foi um presente de Natal antecipado para o quarteto culpados confessos de injúria racial. Talvez Marco Aurélio Xavier devesse convocar Bernardo, Vitória e Rafael. Os três são enteados de Aranha, ele trata com o mesmo carinho que dedica a Sofia, sua filha natural. Depois que o caso estourou os enteados foram chamados de macacos e filhos de macaco na escola onde estudam. Ou então o juiz falar com o próprio Aranha, o ofendido. Vai entender porque ele fez questão de enfrentar os racistas na arena do Grêmio. Saber que ele sofre com o preconceito racial há muito tempo. Como quando foi preso apenas por ser negro e estar dentro de um carro caro em Campinas esperando por um amigo. Três policiais racistas mostraram como acreditam que negro deva ser tratado.

"Falaram que era para eu ficar quieto, que eu era suspeito. Me algemaram, deitaram no chão, queriam saber de arma, mas eu não tinha nada. Tomei um tapa, um chute. Tenho a marca aqui, acho que é a bota do policial", declarou em 2005 o goleiro. Ele ficou preso no camburão. Só foi liberado quando chegou o advogado da Ponte Preta e os policiais viram que era jogador. Apesar da denúncia do revoltado goleiro, nada aconteceu com os policiais. O STJD já havia sido responsável por um desserviço. Depois de eliminar o Grêmio da Copa do Brasil, pelo caso envolvendo racismo, quando foi elogiado no mundo todo, voltou atrás no Pleno. E apenas tirou três pontos do Grêmio, que inviabilizou a partida da volta contra o Santos, já que havia perdido o primeiro jogo. O abrandamento da pena causou alívio para a CBF. Se fosse referendado o primeiro julgamento, todo clube que tivesse torcedores racistas infiltrados poderiam ser eliminados dos torneios. Que seria caótico. Por coincidência, lógico, isso não aconteceu. O Pleno do STJD foi carinhoso com o árbitro Wilton Pereira Sampaio que conseguiu não ver ou ouvir as muitas manifestações de racismo naquela partida. Não colocou nada na súmula. O mais triste de tudo é que Wilton é negro. Patricia Moreira da Silva perdeu o emprego, teve a casa apedrejada. Uma bomba incendiária queimou uma parte da área da residência. Disse que foi ameaçada de estupro pelas redes sociais. Ela está tomando tranquilizantes desde que "tudo aconteceu". Por "tudo aconteceu" se entenda ela gritar "macaco" para Aranha. Seu choro sem lágrimas na ida à Globo para falar com Fátima Bernardes foi lastimável. Patricia ontem caprichou no encontro com o juiz. Não tirou os óculos escuros, entrou cabisbaixa e mandou avisar que não tinha condição psicológica para falar com a imprensa. Nem parecia a mesma garota que posava com cara de nojo, mostrando um macaco de pelúcia com o uniforme do Internacional. Gostou tanto da foto que colocou nas redes sociais.

O juiz Marco Aurélio Xavier não só abrandou a situação dos quatro gremistas. Na verdade, ele decepcionou o Brasil. Ninguém queria que os racistas fossem crucificados. Mas deveriam sim passar pelo julgamento. Ele seria histórico, um marco neste país com tantas injustiças. A boa vontade desse juiz reflete nos vândalos e criminosos. A postura infelizmente estimula que muita gente acredite que estádio é um pedaço do Brasil sem lei. Não é por acaso que parte da torcida organizada gremista sempre canta a romântica música quando o adversário é o rival Internacional. "Somos campeões do Mundo
E da Libertadores também
Chora macaco imundo
Que nunca ganhou de ninguém
Somos a banda mais louca
A banda louca da Geral
A banda que corre
Os macacos do Internacional." Não é à toa que Patricia cansou de repetir. "Não sou racista. Tenho vários amigos negros. Mas me deixei levar pela empolgação. Aprendi ouvindo as músicas da torcida gremista. Não fui só eu quem gritou macaco para o Aranha. Eu fui pega pelas câmeras, mas havia mais gente", relembra a torcedora. O recuo da justiça neste simbólico caso só estimula que vândalos racistas continuem a procurar estádios. E se infiltrar em todas torcidas organizadas. Não só a do Grêmio. A decisão do juiz Marco Aurélio Xavier foi lastimável para o futebol, para a sociedade deste país...




Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 25 Nov 2014 01:41:12

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