quarta-feira, 28 de outubro de 2015

"A extradição aos Estados Unidos de uma pessoa nefasta, corrupta como o Marin me traz conforto. Mas tinha de ser a polícia norte-americana. Aqui, no país da impunidade, seguiria aproveitando sua vida de corrupção." Ivo Herzog, entrevista exclusiva...

"A extradição aos Estados Unidos de uma pessoa nefasta, corrupta como o Marin me traz conforto. Mas tinha de ser a polícia norte-americana. Aqui, no país da impunidade, seguiria aproveitando sua vida de corrupção." Ivo Herzog, entrevista exclusiva...




Existe no Brasil uma pessoa que teve uma sensação diferente ao saber da extradição de José Maria Marin aos Estados Unidos. E saber que corre o sério risco de morrer na cadeia como seu pai. Ela se chama Ivo Herzog. Ele é filho de Vladimir Herzog. Ele era diretor da TV Cultura em plena Ditadura Militar. Marin era deputado estadual pela Arena, partido que sustentava a Ditadura Militar. No dia 7 de outubro de 1975, ele fez um discurso na Assembléia Legislativa de São Paulo, acusando Herzog de ligações com o Partido Comunista Brasileiro. Foi sentença de morte. 18 dias depois, Vladimir era assassinado. "Agentes do II Exército convocaram Vladimir para prestar depoimento sobre as ligações que ele mantinha com o Partido Comunista Brasileiro, partido que atuava na ilegalidade durante o regime militar. No dia seguinte, Herzog compareceu espontaneamente ao DOI-CODI. Ele ficou preso com mais dois jornalistas, George Benigno Jatahy Duque Estrada e Rodolfo Oswaldo Konder.[12] Pela manhã, Vlado negou qualquer ligação ao PCB. A partir daí, os outros dois jornalistas foram levados para um corredor, de onde puderam escutar uma ordem para que se trouxesse a máquina de choques elétricos. Para abafar o som da tortura, um rádio com som alto foi ligado. Posteriormente, Konder foi obrigado a assinar um documento no qual ele afirmava ter aliciado Vlado "para entrar no PCB e listava outras pessoas que integrariam o partido." Logo, Konder foi levado à tortura, e Vlado não mais foi visto com vida. "O Serviço Nacional de Informações recebeu uma mensagem em Brasília de que naquele dia 25 de outubro: "cerca de 15h, o jornalista Vladimir Herzog suicidou-se no DOI/CODI/II Exército". Na época, era comum que o governo militar divulgasse que as vítimas de suas torturas e assassinatos haviam perecido por "suicídio", fuga ou atropelamento, o que gerou comentários irônicos de que Herzog e outras vítimas haviam sido "suicidados" pela ditadura. O jornalista Elio Gaspari comenta que "suicídios desse tipo são possíveis, porém raros. No porão da ditadura, tornaram-se comuns, maioria até."

Conforme o Laudo de Encontro de Cadáver expedido pela Polícia Técnica de São Paulo, Herzog se enforcara com uma tira de pano - a "cinta do macacão que o preso usava" - amarrada a uma grade a 1,63 metro de altura. Ocorre que o macacão dos prisioneiros do DOI-CODI não tinha cinto, o qual era retirado, juntamente com os cordões dos sapatos, segundo a praxe naquele órgão.[13] No laudo, foram anexadas fotos que mostravam os pés do prisioneiro tocando o chão, com os joelhos fletidos - posição em que o enforcamento era impossível. Foi também constatada a existência de duas marcas no pescoço, típicas de estrangulamento." Esses são trechos do livro de Celso Miranda, Vladimir Herzog: Mataram o Vlado. Ivo tinha apenas nove anos na época. E seu pai foi assassinado com 38. As marcas da violenta morte marcaram sua vida. Não conseguiu fugir de uma fortíssima depressão que o acompanhou por "pelo menos 30 anos". Engenheiro naval, hoje atua como diretor-executivo do Instituto Vladimir Herzog, que luta pelos direitos humanos. Ele falou com exclusividade ao blog sobre a extradição de Marin aos Estados Unidos. Do risco dele pegar 20 anos de cadeia por aceitar suborno, propina e lavagem de dinheiro. E poder morrer na cadeia como seu pai. Não assassinado. Mas já ter 83 anos e dificilmente suportar duas décadas trancafiado. Ivo, qual a sensação de saber que Marin será extraditado aos Estados Unidos? O sentimento é de justiça. Não de revanchismo. Mas traz um conforto. Ele é um bandido, uma pessoa nefasta que acreditava estar acima da lei. Sua prisão é simbólica. Sempre achei que, por ser muito bem relacionado e articulado, seria difícil qualquer coisa concreta ocorrer contra ele. Pelo menos não foi como o Ustra, que morreu. (Carlos Alberto Brilhante Ustra foi o primeiro militar a ser reconhecido pela Justiça como torturador. Nos três anos e quatro meses em que comandou o Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo, 502 pessoas teriam sido torturadas no local e 50, mortas pelo órgão.) O Marin está pagando em vida pelo mal que cometeu. Não só ao meu pai, mas a toda sociedade. Ele é uma pessoa nefasta.

Não é irônico que a punição venha justo pelo futebol? E não por sua vida política? Ele sempre foi corrupto, não importa onde estivesse. Mas o que me deixa frustrado é que foi a justiça norte-americana que o prendeu. Se dependesse do nosso país, ele ainda estaria mandando na CBF. Tinha de ser a polícia norte-americana. Aqui, no país da impunidade, ele seguiria aproveitando sua vida de corrupção. Me parece uma punição ao caráter de alguém que, há muitos anos, precisava ser extirpado da sociedade. Marin foi um entusiasta da ditadura, um governador corrupto (era vice de Paulo Maluf, mas em 1982 assumiu o governo de São Paulo porque Maluf renunciou para concorrer a deputado) e um dirigente corrupto. O que ele fez com o meu pai está dentro do contexto de atuação de um mau-caráter. Você imaginava que algum dia ele iria pagar por seus crimes? Não. Infelizmente tudo indica que não pagará por sua corrupção como político brasileiro. Por ter provocado a morte do meu pai. Mas por seu caráter, por roubar. Só que eu preciso destacar que, pelo que li, está negociando sua prisão domiciliar até o julgamento. Ele estaria disposto a pagar R$ 40 milhões de fiança. Mas eu pergunto: de onde vem esse dinheiro? Como um cidadão dessa espécie tem R$ 40 milhões? E ainda vai esperar o julgamento em um apartamento de alto luxo nos Estados Unidos? Isso é revoltante. Está mais do que claro que esse dinheiro ele acumulou na sua vida com as ligações nefastas que sempre cultuou. Só que serve como compensação para quem sempre pensou que estava acima do bem e do mal.

Você acha que os políticos brasileiros ficam desmoralizados com sua prisão? E que o mundo saberá o tipo de gente que dominava o país durante a Ditadura? Infelizmente, não. O que chamará a atenção será o dirigente esportivo corrupto que o Marin é. O mundo não saberá que político criminoso, sem caráter, indigno que foi governador de São Paulo. Uma pessoa desonesta no sentido mais amplo da palavra. E que se aproveitou do poder para enriquecer, se aliar a torturadores, assassinos. Ninguém saberá que o Marin é o pior tipo de pessoa que se possa imaginar. Mas o que importa é que a punição chegou. Pelas mãos dos americanos. E pelo futebol. É interessante Marin ser preso e o padrinho político dele, o (deputado federal Paulo) Maluf estar livre, mesmo sendo procurado pela Interpol fora do Brasil. Só aqui ele não é acusado de nenhum crime, então é parecido. Fico satisfeito porque Mari sempre tinha se safado. Ele tem 83 anos. Se pegar 20 anos de cadeia, dificilmente sairá vivo. Não é irônico, já que ele provocou a morte do seu pai, também poder morrer em uma prisão? Olha, eu tenho de lembrar que ainda haverá o julgamento. E esse tipo de gente tem acesso a muito dinheiro. É preciso esperar. Aprendi a muito tempo a não me iludir. Mas hoje estou mais confortável com essa extradição. O Brasil é o país da impunidade. Se ele estivesse por aqui estaria aproveitando do que roubou. Mas chegaram os americanos e mostraram que lugar de gente sem caráter, desonesta, corrupta é na cadeia. Pena que o Brasil não tenha capacidade de lidar com pessoas desse tipo. Gente que serviu a Ditadura. Colaborou com prisões, torturas, assassinatos. José Maria Marin é um criminoso da pior espécie. Mas que virou governador de São Paulo e presidente da CBF neste país...




Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 28 Oct 2015 16:04:04

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