terça-feira, 24 de maio de 2016

Desfile de torcedor morto, churrasco e até aniversário de chefe de organizada no estádio. O Independiente mostra até onde pode chegar a promiscuidade entre dirigentes e torcedores. Esta é a América do Sul...

Desfile de torcedor morto, churrasco e até aniversário de chefe de organizada no estádio. O Independiente mostra até onde pode chegar a promiscuidade entre dirigentes e torcedores. Esta é a América do Sul...




Se fosse roteiro de filme pareceria inverossímil. Mas é a triste realidade. E mostra porque tantos presidentes de clubes abrem as portas de seus clubes às suas organizadas. De preferência, a mais violente. A relação entre o presidente do Independiente e La Barra del Rojo é mais do que promíscua. É indecente. As barras bravas, organizadas argentinas, sempre tiveram regalias junto às direções dos principais clubes. Principalmente no Independiente. Bicampeão mundial e sete vezes campeão da Libertadores da América. Mesmo sem a rala desculpa que existe por exemplo em São Paulo, o Carnaval, os líderes das torcidas desde a década de 80 exigem uma "colaboração" aos dirigentes. Exigem, não pedem. E sempre tiveram transporte, lugar reservado no estádio, e sua principal fonte de renda. Ingressos. Milhares para que revendam aos torcedores comuns. Vendiam, ficavam com o dinheiro, e tinham acesso gratuito ao estádio Libertadores da América, em Avellaneda, grande Buenos Aires. Uma indecência. Os próprios sócios não suportavam mais a farra das organizadas. E escolheram como presidente Javier Cantero, em 2010. Sua principal promessa de campanha era acabar com a mordomia dos torcedores. O Independiente parou de dar ingressos, subsidiar viagens, reservar lugar para a Barra de Rojo. Foi uma declaração de guerra. E aceita com toda selvageria.

Os membros da torcida começaram a ameaçar o presidente de morte. A pressionar os conselheiros que o apoiavam. Perturbaram jogadores, treinadores. O ambiente no clube ficou insuportável. As barras bravas fizeram um pacto de silêncio. Não apoiavam o time. E batiam nos torcedores que tentavam gritar, apoiar a equipe. Quando jogadores e comissão técnica chegavam para treinar, lá estavam representantes da torcida para pressioná-los. Os dirigentes tinham medo de ir ao estádio. As derrotas se acumularam. Treinadores não tinham paz para trabalhar. Ramón Díaz, Cristian Díaz, Gallego y Brindisi fracassaram. E pela primeira vez na história, o Independiente foi rebaixado em 2013. Javier Cantero teve o seu escritório invadido por vândalos das barras bravas. Foi xingado, humilhado e novamente ameaçado de morte. Os "torcedores" queriam de volta as regalias, as viagens, os ingressos para serem revendidos. A oposição se aproveitava desse ambiente caótico e passou a rejeitar as contas apresentadas pelo presidente. A torcida chegou até a agredir Cantero em uma reunião do clube. A agressão foi ao vivo. Deu tempo para a tevê mostrar. Mas torcedores abaixaram as câmeras logo depois. O dirigente foi empurrado, tomou socos, pontapés.
Seu mandato deveria terminar em dezembro de 2015. Mas em março, depois que sua esposa foi ameaçada de morte, Cantero desistiu. E renunciou. Foi motivo de festa para os barras bravas. O motivo: eles sabiam que Hugo Moyano era o grande favorito a presidente do Independiente. Ganhou fácil a eleição em junho de 2014. Novo motivo para comemoração dos vândalos. Hugo deve sua vida política aos sindicatos de transportes pesados. Peronista, conseguiu destaque durante a Ditadura Militar. É um populista assumido. E com profunda ligação com os chefes das organizadas. Na Argentina se tornou uma triste prática, membros das barras bravas tomarem partido nas greves. E sempre com participações violentas. Não por coincidência, os sindicatos que Moyano apóia sempre tiveram a proteção de torcedores do Independiente. E não de forma pacífica. Como é uma relação íntima, promíscua, Moyano propicia tudo o que os "torcedores" exigem. O "apoio" voltou. Principalmente em relação aos ingressos. O quinhão das organizadas fica separado para que seja revendido aos torcedores comuns. É bizarro. Mas aceito de forma constrangedora no Independiente. Só que tudo já está passando do limite do bom senso. No final de 2014, o presidente do clube deixou o estádio à disposição dos barras bravas. Lá eles fizeram um churrasco ao lado do gramado. E tiveram livre acesso ao campo. As fotos são constrangedoras.

Pablo "Bebote" Álvarez é o chefe da La Barra del Rojo. E convocou pelas redes sociais os torcedores para a festança. Mas haveria mais. Bebote resolveu comemorar seu aniversário também no estádio. E, lógico, o presidente aceitou. Mas o que aconteceu ontem pela manhã passou de todos os limites. Na quinta-feira, Pablo José, outro líder da Barra del Rojo, sofreu um grave acidente com sua moto. Acabou morrendo na manhã do domingo. A torcida decidiu que "Gordo de Wilde" como era conhecido, merecia uma última homenagem antes de ser enterrado. E outra vez Moyano deixou o estádio à disposição da organizada. Cerca de cem torcedores foram ao estádio com o corpo de Pablo José dentro de um caixão. E fizeram a despedida, circulando com ele pelas arquibancadas, pelo gramado, um cortejo macabro, absurdo.

O retrato mais divulgado de José, ainda vivo, é marcante. Sorrindo com um revólver. As fotos ganharam o mundo. E denunciam o que acontece quando um clube se torna refém de uma torcida. Não há o menor cabimento essa ligação promíscua. Moyano se mantém no poder graças ao terror que a organizada provoca. Ele ganha espaço no confuso cenário político argentino. Peronista de carteirinha e aliado dos Kirchner. Está articulando sua candidatura a presidente da Argentina. Se for, seus adversários que preparem para os barras bravas. Tomara que presidentes de clubes brasileiros não se inspirem. E caiam na tentação de fazer do Independiente seu modelo de gestão. Não é nada difícil. Até porque já há várias equipes no caminho. Dominadas por suas torcidas. Este é o futebol da América do Sul. Seus dirigentes e, principalmente, suas organizadas...





Fonte: Esportes R7
Autor: cosmermoli
Publicado em: 24 May 2016 13:52:27

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